Por Jessyanne Bezerra / Repórter Tribuna do Norte
“Não está recebendo nem amistosos, vai receber jogo da Copa?”, comenta treinadora potiguar, Denise Fernandes, sobre a Arena das Dunas. Com o anúncio de que o Brasil será sede da Copa do Mundo Feminina de 2027, feito no dia 17 de maio, a empolgação para o país voltar a estar no centro do maior evento esportivo do mundo foi notável. No entanto, após a divulgação da lista de estádios que vão receber os jogos, foi inevitável o questionamento sobre a ausência de Natal e do Rio Grande do Norte como um dos palcos do evento.
A escolha das cidades que vão sediar a Copa foi feita antes da confirmação de que o Brasil receberia o evento. No vídeo de apresentação da candidatura brasileira ao mundial feminino, em maio deste ano, a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e o Ministério do Esporte (MESP) já haviam definido quais as cidades receberiam o torneio no evento da FIFA.
E o trajeto da CBF para entregar os convites às capitais no nordeste foi feito pelo secretário-geral Alcino Rocha. No dia 26 de setembro de 2023, Rocha foi até Salvador, na Bahia, entregar o primeiro convite. No encontro, a CBF formalizou a proposta com representantes do governo baiano na Secretaria do Trabalho, Emprego, Renda e Esporte (Setre).
Já em 27 de setembro, foi a vez de Recife receber o convite oficial da CBF. Na capital pernambucana, Rocha anunciou a inclusão da cidade no torneio mundial, durante evento na Federação Pernambucana de Futebol (FPF). Por fim, no dia 28 de setembro, foi a vez de Fortaleza, no Ceará, receber o convite. Pelas mãos de Alcino Rocha, o governador cearense recebeu a convocação para sediar o evento da FIFA.
Surpresa
“Surpreendente”, foi assim que o Governo do RN e a Federação Norte-rio-grandense de Futebol (FNF) descreveram o fato de Natal ficar de fora da Copa.
Segundo o Governo, a corrida do RN para se tornar uma das sedes do evento teria começado em Outubro do ano passado. O secretário estadual de Esportes (SEL), Cézar Nunes, informou que o Estado buscou contato com o ministro do esporte André Fufuca para ser uma das opções de sede. “Ainda no ano passado, no mês de outubro, quando a gente teve o conhecimento oficial de que o Brasil estava se candidatando a ser sede da Copa, por orientação da governadora, solicitamos ao Ministério do Esporte (a inclusão)”, esclarece o titular da pasta.
De acordo com o secretário, toda a comunicação sobre o RN ser um dos palcos do mundial com o ministério foi feita via Gabinete Civil. “Ministério deu um OK e disse que essas questões das sedes iriam ser discutidas logo após o anúncio da escolha do Brasil ser sede ou não. Com tudo isso, ficamos aguardando e aí fomos surpreendidos naquela última sexta-feira (dia 17)”, explica Cézar Nunes.
Já para o presidente da FNF, José Vanildo, as negociações para trazer a Copa para o RN se deram apenas em novembro. “No mês de novembro do ano passado, o próprio governo do Estado já tinha manifestado esse desejo ao ministro Fufuca”.
Apesar disso, não houve avanços. Cerca de três meses após o primeiro contato oficial, em fevereiro de 2024, a FIFA, junto com membros da CBF, visitou as 10 cidades e os estádios, elaborando o relatório que foi votado pelos membros do comitê. Natal não estava no roteiro. Posteriormente, essa votação elegeu o Brasil como sede.
Diante do cenário, restou ao RN e seus representantes correr atrás para reverter o jogo. Para o presidente da FNF, Natal ainda tem tempo para seja incluída como sede: “Há um tempo razoável de três anos para a realização de evento. Temos questões, por exemplo, no Rio Grande do Sul, que pelo momento que atravessa, a gente não sabe como vai ser essa definição. Então, haverá, sim, esse reexame ”.
Outros meios também foram utilizados, depois do anúncio. A governadora Fátima Bezerra se reuniu com o presidente da CBF, Ednaldo Rodrigues, para avaliar a candidatura potiguar. “A CBF assumiu um compromisso com a Federação, com o Governo do Estado, e ainda nesse mês de junho e já envia uma comissão, da comissão organizadora, agora na condição de Brasil como sede, de visitar novamente o Estado e oferecer uma nova avaliação com possibilidade do Rio Grande do Norte passar a integrar como a sede do evento”, afirmou José Ivanildo.
Em relação a visita da CBF, tanto o Governo do RN quanto a FNF não sabem informar quando irá ocorrer. José Ivanildo afirma que será neste mês. Já o secretário Cézar Nunes diz que pode ser que ocorra entre junho e agosto: “Ainda não sabe se em junho ou em agosto, mas terá visita técnica da CBF para, possivelmente, também estar entre as concorrentes”.
Ex-seleção e treinadora desabafam
Para Suzana Ferreira, a primeira potiguar que jogou pela Seleção Brasileira, e Denise Fernandes, treinadora com licença A da CBF e criadora do projeto Desenvolvimento do Futebol Feminino no RN, a ausência de Natal como sede da Copa do Mundo é um reflexo de como tratam o futebol feminino potiguar.
“É triste, mas não surpreende”, afirma Denise. Para a treinadora, falta muito para que o RN se coloque como um Estado que investe em políticas públicas para desenvolver o futebol feminino. “Acho muito difícil, mesmo fazendo solicitação, que Natal consiga a inclusão”.
Atualmente, Fernandes trabalha como coordenadora em uma das escolas de futebol do São Paulo Futebol Clube (SPFC). “É completamente diferente a forma como eles tratam o feminino aqui em São Paulo”, descreve a treinadora e ainda complementa que nos jogos do Corinthians feminino, a Neo Química Arena chega a receber até 40 mil torcedores. Nas arquibancadas, existe o respeito pelas jogadoras. “Eles não xingam as jogadoras, eles não xingam o time, os ingressos dos jogos são acessíveis. Então é uma realidade totalmente diferente.”, afirma Denise.
Em relação ao apoio e políticas públicas para o futebol feminino, Fernandes analise que há muito o que melhorar. Para a treinadora, a modalidade não pode ser só marketing: “Natal precisa evoluir muito. No masculino, muito. E no feminino, não tem políticas públicas. A governadora falar que quer mas não apoia o único time que faz o trabalho, que está no brasileiro. Então, entre você falar e fazer, é uma distância muito grande”.
Já a ex-jogadora da Seleção Brasileira, descreve um misto de sensações com o anúncio: “Foi uma alegria muito grande. Para a gente trazer essa medalha, que lutamos muito, e dentro da nossa casa é uma felicidade enorme. É uma coisa que ninguém esperava (sediar a Copa), a gente luta há muito tempo”.
Suzana não esconde o descontentamento da não inclusão de Natal como sede. “É triste, nosso campo tem uma potência de jogos. E o estádio daqui é bem melhor, já vieram jogos para cá e não ter vindo assim, é um absurdo”.
Para Suzana, o problema do RN não estar na Copa é consequência do descaso e de como tratam o futebol feminino no Estado. A ex-jogadora revela que não faz sentido querer ser o palco do futebol mundial se não conseguem valorizar o futebol potiguar: “Você fica se perguntando ‘Por que? O que foi que aconteceu? Mas ai, você lembra, da Walessa, treinadora do União, que foi para as quartas de final do Brasileiro sem patrocínio algum. Tendo que fazer rifa, bingo, para pagar passagem para as meninas. Fica difícil, em pedir e procurar e sempre ter um ‘não’. Já está na hora, não precisamos mais mostrar, já sabemos, já estamos vendo e sabemos que vem verbas”.